17/07/2014

DECIFRANDO O QUEBRA-CABEÇAS - parte final

Em Inglês, um artigo revelador, da conhecida publicação britânica Economist

  
The new age of crony capitalism - Political connections have made many people hugely rich in recent years. But crony capitalism may be waning

Tentando uma breve leitura em diagonal, este artigo da Economist critica o "capitalismo de compadres" (do qual é um exemplo bem conhecido o mexicano de origem libanesa Carlos Slim, o "homem mais rico do mundo", dono de telecoms no México e por toda a América latina, além de inúmeros outros negócios). 

A revista considera que este capitalismo de compadrio é praticado numa série de países emergentes -  Ucrânia, Rússia, China, México, Brasil, Índia, Turquia - onde no passado muitos magnatas se produziram à custa de negócios fraudulentos protegidos por políticos corruptos, hoje postos em causa pelos novos ventos que sopram.

"BOM" E "MAU" CAPITALISMO

Então, para a Economist, o "bom capitalismo" seria representado sobretudo pelos norte-americanos e ingleses, e por  esta União Europeia onde "gente virtuosa" no poder estaria decidida a acabar com os privilégios dos antigos "magnatas do compadrio".
 

Será que a Economist pensa em Obama ao atribuir tal intenção? É que há um problemazinho, o próprio presidente dos EUA reconhece que não conseguiu reformar quase nada... veja-se a sua muito tímida tentativa no sistema de saúde, visando mudanças mínimas no  fraudulento e predador capitalismo norte-americano - falhou rotundamente.

Quanto às boas intenções da UE de Merkel, os povos da periferia europeia ocidental conhecem-nas bem, e a destruição da classe média e do Estado social em Portugal e na Grécia são exemplos mais que esclarecedores.  

Diz a publicação que este capitalismo de compadrio baseado em favores do Estado teve uma forte expressão
nos EUA do séc. XIX. Deve ser uma imprecisão da revista, o século dezanove é considerado pelos compêndios um expoente da concorrência perfeita. 

Em conclusão do artigo, o autor apura o seu melhor e mais imaginativo estilo literário, concluindo que:

"O boom que criou uma nova classe de magnatas também criou a sua nemesis.

Há um novo culto  da classe média urbana e dos contribuintes que exige a mudança. 
E isso é algo que tanto os magnatas como os líderes eleitos não podem mais ignorar, a não ser que queiram correr sérios riscos".
 

Em suma: o bonito filme da Economist é o duma nova revolução capitalista em curso nos países emergentes, mas sobretudo nos países ricos, que mete na ordem todos os  velhos monopólios abusivos . 

E o 'happy ending' deste muito imaginativo filme neoliberal seria um hiper-capitalismo de saudável concorrência entre empresas. E, claro, pleno de bondade para com as classes médias...

MÁSCARA SORRIDENTE DA SINISTRA NOVA ORDEM CAPITALISTA

É mais um dos "admiráveis mundos novos" à Aldous Huxley, cuja propaganda ciclicamente o capitalismo engendra, depois de (quase) cair no abismo em cada crise mundial e histórica.

A ver vamos se desta vez consegue sair por cima, como nas anteriores. Por mim, deixo o aviso de que tenho as mais sérias dúvidas. (1)ver justificação em rodapé

A talhe de foice, por falar em Economist,  agora percebo porque Passos Coelho organizou essa encenação da Cimeira/Summit de Fevereiro 2014 em Cascais (onde ele foi aliás o único 1º ministro - uma Summit a solo (!) - peculiaridades da nossa Parvónia...), e percebo porque teve o aval da revista inglesa - nada como juntar clientes da mesma "causa" para classificar como positivos os 3 terríveis anos de saque desenfreado executado pelo grupo P&P sob a batuta da troika.

Passos Coelho, apesar da inexperiência executiva que lhe é atribuída,  mostra o quanto está "por dentro" da boa propaganda ao estilo "nova ordem".
 

Nova ordem onde os grandes tubarões globais arrasam os magnatas à antiga, enquanto  proclamam um imaginário capitalismo cor-de-rosa caído do céu.
 

Você acha que tais proclamações são apenas propaganda? Se respondeu sim, acertou!

Propaganda aliás com contornos sinistros na presente conjuntura, onde a fantasia delirante da Economist é brutalmente contrariada pela realidade do esmagador desemprego jovem, da precaridade, dos salários miseráveis, do criminoso assalto aos fundos dos pensionistas que pagaram toda a vida para os financiar, do não cumprimento dos serviços mínimos na saúde, na educação, nos transportes, na justiça, que o Estado - esvaziado por este capitalismo da nova ordem -  deveria prestar às populações.

Mas não é falsa em relação à ordem antiga - cuja destruição é real.  O terrível "detalhe" é que esta nova ordem é, e será de forma cada vez mais óbvia, muito mais implacável com o povo do que a antiga.

CAVALGAR O TSUNAMI DA CRISE

Para lá do "barulho das luzes de néon" dos falsificadores de serviço nos media, a crua realidade arrasta no tsunami da crise tanto os antigos grupos económicos nacionais como as classes médias e os  trabalhadores, com perda de direitos conquistados ao longo de séculos.  

No fundo, pela propaganda, procura-se esconder o RESULTADO ATERRADOR das políticas em curso - um dos mais violentos saques perpretados na História - em que os países mais ricos (EUA, Europa do norte) saqueiam os outros (3º mundo, ascendentes, Europa do sul), e os grandes tubarões da economia global saqueiam as classes médias e, à boleia, aproveitam para  tomar o lugar dos tais "magnatas do compadrio" agora fragilizados.

Portugal é um excelente exemplo disto. 

A  queda fragorosa do grupo Espírito Santo, não só está permitindo aos habituais capachos mediáticos do novo capitalismo de casino darem-se ares progressistas com críticas ao "velho capitalismo" do GES,  como gerou uma onda de alegria serôdia  naquela esquerda avessa ao raciocínio mas sempre pronta a salivar quando quem controla a agenda mediática lhe lança um biscoito sob a forma de notícia.

Passos Coelho e António Costa logicamente também cavalgam esta onda. 

Na mesma onda flutuam ainda uma série de personagens e grupos que, receosos de se afogarem, marcam já o seu lugar na fila, ávidos dum minuto de fama mediática e  babando à vista duma "promissora carreira" a partir de qualquer plataforma "realista" e "governativa" que lhes seja proposta pelo próximo governante colaboracionista da nova ordem.

Aliás, o  tempo se encarregará de tornar óbvio o papel que cabe a cada  protagonista ou figurante, como António Costa, Ana Drago, Podemos, MAS, 3D, Livre, BE, PCP, Marinho Pinto, etc. etc.

Fiquem calmos, em breve conhecerão o próximo capítulo desta lamentável prestigitação partidário-mediática nacional.

Infelizmente, o relógio corre contra NÓS, PESSOAS, cidadãos comuns.


Porque esta forma de fazer política e de gerir a economia não só não beneficia as classes médias e o povo, como os vai  lançando numa vida cada vez mais medíocre, pobre e sem esperança.  

Mas essa, não é justamente a experiência portuguesa em curso, tal como a irlandesa, a espanhola, a italiana, a grega, a cipriota ?

Este artigo da Economist, se alguma vantagem tem, é a de esclarecer o que os tubarões da nova ordem capitalista dos clubes Bilderberg e cia.
andam a tramar, aqui e no mundo todo. 

O puzzle que permite a sobrevivência de figuras tão improváveis e desclassificadas como Coelho, Cavaco ou Portas, ou esse outro que está por detrás da complexa trama das troikas da UE-FMI, assim como o sentido real dos rearranjos à esquerda e ao centro, começa a decifrar-se. 

O enigma caminha rapidamente para o epílogo.

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(1) Sérias dúvidas de que  as potências capitalistas ricas desta vez possam "dar a volta por cima" como nas anteriores grandes crises históricas.
Essa seria matéria para um outro artigo.

Mas, resumidamente, acredito que estamos perante um novo paradigma em que os emergentes ganham o espaço que lhes é próprio a nível mundial.
Só os cinco BRICS - que recentemente oficializaram o seu próprio e novo FMI -  representam já 65% do crescimento global, e em 2015 pesarão um quarto da economia mundial. 

A única forma de barrar o tsunami económico e social que eles representam é uma nova guerra mundial.
Apenas truques financeiros e medidas predadoras - que são, no fundo, a sórdida realidade por trás da máscara moralista das Economist deste mundo - por mais ardilosos e subterrâneos que sejam, dificilmente impedirão a gigantesca massa de emergentes + 3º Mundo de recuperar a fatia do bolo da riqueza mundial que lhes pertence.



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